21 de agosto de 2009

Três Perguntas


Certa vez ocorreu a um Rei que se ele sempre soubesse a hora certa de começar tudo; se sempre soubesse quais as pessoas certas a escutar e a quem evitar; e acima de tudo, se sempre soubesse qual a coisa mais importante a se fazer, jamais falharia em nada que se dispusesse levar a cabo.
E tendo-lhe ocorrido este pensamento, ele proclamou pelo seu reino afora que daria uma grande recompensa a qualquer pessoa que lhe ensinasse a hora certa para cada ação, e quem eram as pessoas mais necessárias, e como poderia saber qual a coisa mais importante a ser feita.
E homens estudados vieram ao Rei, mas todos responderam suas perguntas de maneira diferente.
À primeira pergunta, alguns responderam dizendo que para saber a hora certa para cada ação é preciso elaborar com antecedência uma tabela de dias, meses e anos, e viver estritamente de acordo com ela. Só assim, diziam eles, tudo poderia ser feito no momento apropriado. Outros declararam que era impossível saber de antemão a hora certa para cada ação; mas que, não se deixando absorver por passatempos ociosos, é preciso estar atento a tudo que se passa e então fazer o que for mais necessário. Ainda outros disseram que por mais atento que fosse o Rei, era impossível apenas um homem decidir corretamente a hora certa para toda ação, mas que ele deveria ter um conselho de sábios que o ajudariam a determinar o momento adequado para tudo.
E ainda outros disseram que havia certas coisas que não podiam esperar para serem expostas diante de um conselho, mas que exigiam uma decisão imediata. Mas para que esta decisão fosse tomada, era preciso saber de antemão o que aconteceria. E só os mágicos sabem isso; e, portanto, para saber a hora certa para toda ação, é preciso consultar os mágicos.
Igualmente variadas foram as respostas para a segunda pergunta. Alguns disseram que as pessoas que o Rei mais precisava eram seus conselheiros; outros, os padres; outros, os médicos; alguns disseram que os mais necessários eram os guerreiros.
Para a terceira pergunta, sobre qual era a ocupação mais importante: alguns disseram que a coisa mais importante do mundo era a ciência. Outros disseram que era a prática da guerra; e outros ainda, disseram que era o culto religioso.
Sendo todas as respostas diferentes, o Rei não concordou com nenhuma delas, e não recompensou ninguém. Mas ainda disposto a encontrar as respostas certas para suas perguntas, decidiu consultar um eremita conhecido em toda parte pela sua sabedoria.
O eremita vivia num bosque de onde jamais saía, e não recebia ninguém a não ser gente do povo. Então o Rei vestiu roupas comuns, e antes de alcançar o abrigo do eremita, desmontou do seu cavalo, e deixando atrás a sua guarda, caminhou sozinho.
Quando o Rei se aproximou, o eremita estava cavando o solo diante de sua choupana. Ao ver o Rei, ele o cumprimentou e continuou a cavar. O eremita era frágil e fraco, e toda vez que enfiava a pá no chão e revirava um pouco de terra, ouvia-se a sua respiração pesada.
O Rei aproximou-se dele e disse: "Vim procurá-lo, sábio eremita, para pedir-lhe que responda três perguntas: Como posso aprender a fazer a coisa certa na hora certa? Quem são as pessoas que mais necessito, e às quais devo, portanto, prestar mais atenção do que ao resto? E, quais são os assuntos mais importantes, e exigem primeiramente a minha atenção?"
O eremita escutou o Rei, mas nada disse. Apenas cuspiu na mão e recomeçou a cavar.
"Você está cansado", disse o Rei, "deixe-me pegar a pá e trabalhar um pouco no seu lugar."
"Obrigado!" disse o eremita, e tendo dado a pá ao Rei, sentou-se no chão.
Após ter cavado dois canteiros, o Rei parou e repetiu suas perguntas. Novamente o eremita não deu resposta, porém levantou-se, esticou o braço para pegar a pá, e disse:
"Agora descanse - e deixe-me trabalhar um pouco."
Mas o Rei não lhe deu a pá, e continuou a cavar. Passou-se uma hora, e mais outra. O sol começou a descer atrás das árvores, e o Rei finalmente enfiou a pá no chão e disse:
"Eu vim à sua procura, sábio homem, em busca de respostas para minhas perguntas. Se você não pode dá-las, diga-me, e voltarei para casa."
"Aí vem alguém correndo", disse o eremita; "vejamos quem é."
O Rei virou-se e viu um homem de barba, correndo para fora do bosque. O homem segurava suas mãos contra o estômago, e sob as mãos havia sangue. Quando chegou ao Rei, caiu desmaiado, gemendo debilmente. O Rei e o eremita abriram as roupas do homem. Havia um grande ferimento em seu estômago. O Rei lavou-o da melhor forma possível, e improvisou uma bandagem com seu lenço e uma toalha do eremita. Mas o sangue não parava de correr, e o Rei não parava de tirar a bandagem ensopada de sangue quente, lavando-a e atando-a novamente. Quando finalmente o sangue parou de correr, o homem se reanimou e pediu algo para beber. O Rei trouxe-lhe água fresca. Entrementes o sol já se tinha posto, e o tempo esfriara. Então o Rei, com o auxílio do eremita, carregou o ferido para a choupana e deitou-o sobre a cama. Deitado, o homem fechou os olhos e ficou quieto; mas o Rei estava tão cansado pela caminhada e pelo trabalho que fizera, que agachou-se na soleira, e também adormeceu - tão profundamente que dormiu a noite toda, uma curta noite de verão. Quando despertou pela manhã, demorou até conseguir se recordar onde estava ou quem era o estranho homem de barba deitado na cama fitando-o intensamente com os olhos brilhantes.
"Perdoe-me!" disse o homem de barba com voz fraca, quando viu que o Rei estava desperto, olhando para ele.
"Eu não o conheço, não tenho nada a perdoar", disse o Rei.
"Você não me conhece, mas eu o conheço. Sou aquele inimigo seu que jurou se vingar por você ter executado o irmão e se apossado de suas propriedades. Eu sabia que você tinha vindo sozinho ver o eremita, e resolvi matá-lo na volta. Mas o dia passou, e você não voltava. Então saí do esconderijo para encontrá-lo, e aproximei-me da sua guarda, eles me reconheceram e me feriram. Fugi de lá, mas teria sangrado até morrer se você não tivesse cuidado do ferimento. Eu queria matá-lo, e você salvou a minha vida. Agora, se eu viver, irei serví-lo como o escravo mais fiel e meus filhos farão o mesmo. Perdoe-me!"
O Rei ficou muito contente em fazer as pazes com seu inimigo com tanta facilidade, tendo-o ganho como amigo; não só o perdoou, como disse que enviaria seus servos e seu próprio médico para atendê-lo, e prometeu devolver suas propriedades.
Deixando o ferido, o Rei saiu para a varanda e procurou o eremita. Antes de partir, ele queria pedir mais uma vez uma resposta para as perguntas que tinha formulado. O eremita estava do lado de fora, de joelhos, espalhando sementes nos canteiros que haviam sido cavados no dia anterior.
O Rei aproximou-se dele e disse: "Pela última vez, eu lhe rogo que responda as minhas perguntas, sábio homem."
"Você já obteve as respostas!" disse o eremita, ainda ajoelhado, olhando para o Rei parado à sua frente.
"Como? O que você quer dizer?" perguntou o Rei.
"Você não vê," replicou o eremita. "Se ontem você não tivesse se apiedado da minha fraqueza e não tivesse cavado estes canteiros para mim, e tivesse voltado, aquele homem o teria atacado e você teria se arrependido de não ter ficado comigo. Então a hora mais importante foi a hora em que você estava cavando os canteiros; e eu fui o homem mais importante; e fazer o bem para mim foi o seu assunto mais importante. Depois, quando o homem correu na nossa direção, a hora mais importante foi a hora em que você o estava atendendo, pois se você não tivesse cuidado dos ferimentos dele, ele teria morrido sem fazer as pazes com você. Então, ele foi o homem mais importante, e o assunto mais importante foi aquilo que você fez por ele. Então lembre-se: existe apenas uma hora que é importante - AGORA! É a hora mais importante porque é a única hora em que possuímos algum poder."


Leon Tolstói